Gilvan Alves Anastácio
Direito do Trabalho
MELHOR FALAR COM UM ESPECIALISTA (Parte 1)

Nesses mais de 25 anos de advocacia trabalhista, ouvi por várias vezes colegas de outras áreas dizerem que “Direito do Trabalho é facinho”. E, nessa batida, quando um clínico geral caía ali de paraquedas, a gente não conseguia esconder a satisfação.
Não vai aqui nem um pouco de arrogância ou presunção. Se eu me aventurasse a advogar, por exemplo, no Direito Agrário, com certeza levaria muito chumbo na asa, pois ali não é o meu terreno.
E é com a intenção de demonstrar que há muito tempo o Direito do Trabalho passou a ser assunto para especialista, que eu posto aqui este primeiro de uma série de artigos em que tratarei de situações processuais concretas, onde o conhecimento profundo e específico da matéria pode fazer toda a diferença.
Relação de emprego. Quem deve provar?
Primeiramente, eu convido o leitor a dar uma olhada, caso queira, na nova redação do artigo 818 da CLT, trazida pela Lei 13.467/2017, onde o legislador trabalhista trata do ônus da prova de modo geral.
Indo logo ao que interessa, imagine que um trabalhador ingressou com ação cobrando aviso prévio, férias, 13º salário e um punhado de horas extras. Na defesa, o réu alega que sequer conhece o sujeito e que, portanto, nada lhe deve.
Em depoimento, a única testemunha do reclamante diz que nunca esteve na empresa reclamada, e só sabe que o obreiro ali trabalhava porque ele próprio lhe dissera.
O Juiz, então, pergunta ao advogado da empresa:
- Tem testemunha, doutor?
- Tenho, Excelência. Uma.
- Vai querer ouvir?
- Sim! - responde o advogado com altivez e valentia.
E eis que a testemunha da empresa surge como um anjo na vida daquele empregado. Nitidamente assustada com as advertências que o Juiz, obrigado por lei, acabara de lhe fazer, a pobre senhora não consegue calar, nem omitir a verdade, e confirma que conhece o reclamante e que ele trabalhou como ajudante de entregas na firma de seu patrão. O clínico geral quase derrete na cadeira.
A ação é julgada totalmente procedente, inclusive quanto às horas extras, já que a arriscada tese de negativa total do vínculo de emprego impediu que a reclamada contestasse a jornada de trabalho, pois isso seria um contrassenso.
E onde o advogado da empresa errou? É simples!
Se a empresa negou a prestação de serviços, cabia ao reclamante provar que para ela trabalhou, por ser este o fato constitutivo de seu direito, segundo o tal artigo 818.
Mas, se a testemunha até então ouvida só sabia dos fatos por ouvir dizer do próprio reclamante (valor probatório igual a zero), por que diabos o advogado da empresa tinha que ouvir sua testemunha?
Sem entrar no mérito ético da questão, falando apenas em estratégia processual, se o patrono da reclamada fosse um bom conhecedor de processo trabalhista, seria assim:
- Tem testemunha, doutor?
- Tenho, Excelência, mas vou dispensar.
Nessa hipótese, ainda haveria o risco de o Juiz querer ouvir a senhorinha como Testemunha do Juízo (e ele pode fazer isso!).
Mas, se o advogado fosse um ninja na área trabalhista (lembrando que não se discute aqui o aspecto ético da defesa), o assunto morreria desse jeito:
- Tem testemunha, doutor?
- Não – responde o advogado, dando uma cotovelada discreta no dono da empresa.
A verdade, para concluir, é que um advogado especialista em Direito do Trabalho dificilmente opta por uma negativa total de vínculo empregatício (falar que o cara nunca trabalhou na empresa), pois o risco dessa tese de defesa, como já se disse, é altíssimo, podendo resultar em condenações gigantescas, já que todas as demais matérias da ação ficam sem defesa. É quase que um tudo ou nada.
Por hoje eu fico por aqui. No próximo artigo abordarei outras situações do dia a dia das lides trabalhistas. Até lá!